A solidão
comporta a saudade e pelo canto da boca as covas confirmam que foi uma luta
constante. Uma ousadia de si para consigo, porque viver sozinho não dá sangue,
não dá vontade. E dói olhar para fora e ver o sol nascer e quando voltar pra
dentro perceber o tempo passando e ainda saber que muito ou quase nada há a
fazer.
Não compreendo em verdade qual
o real sentido da solidão, pois ela se multiplica. Para se ter uma ideia há a
até a tal da solidão acompanhada.
A alegria de ver a casa cheia.
Mas não tão cheia a ponto de apenas preencher lugar no espaço, mas de modo a
revigorar uma vida que sente falta de um carinho, um cuidado, um amor. São
amores desajeitados com seus vales e picos de acertos e erros, mas no peito a
alegria, sem dúvida, de ver os frutos darem flores.
Não importa a idade, o
sentimento sempre será o mesmo. Um amor sem limites, uma preocupação singular.
Durante toda uma vida fui partes de um todo. Durante toda a minha vida busquei
conquistar, me pus a sonhar. Fui aquilo que eu deveria ser. Fui aquilo que eu
pude ser.
Com toda a certeza me lamento
e arrependo de coisas que fiz ou deixei de fazer, mas as épocas são outras. O
tempo passou e nem vi. Trabalhei demais, amei demais, sofri demais, aprendi.
Demasiado ou de menos, mas passei por tudo o que um dia você passou ou passará.
Se errei foi por ignorância.
Se errei foi por amor, ou até mesmo por ignorância do próprio amor. Agora quase
no fim, fico presa a pensamentos insanos, pois nem mesmo eu sei o que pode
acontecer.
Hoje já lhe peço pouco mais de paciência
se meus passos já não conseguem o acompanhar, se preciso de ajuda pra tudo. Se
meus passos são lentos, se olhar para você não aguento e choro. Uma rotina
frenética, uma solidão distribuída nos afazeres da casa. Pensamentos que me
afrontam e amedrontam.
Às vezes quero colo, às vezes
quero o fim. Às vezes revigoro e caminho com esperança de chegar cada vez mais
longe, enfim.
Estou presa aqui admirando o
vazio dos corpos, contemplando a riqueza dos inesperados dias de glória e
implorando um respirar mais calmo e profundo.
Um abraço, um olhar, um gesto,
um toque, um silencio para mim é tudo. Nesta altura, o que não me importa é a
ganância que “rola” lá fora. Sinto medo, muito medo, mesmo muito mas muito
medo. Não do fim, mas de um fim solitário.
Estar sozinho é diferente de
SER sozinho, pois o primeiro é temporário.
Certeza nenhuma eu tenho do
que pode acontecer. Não sou dona do destino, muito menos vidente sem tino. A
luta, ao fim, valeu apena e, vergonha nenhuma devo, eu, ter de quem um dia fui.
Fui tudo o que estava ao meu alcance. Fui o que tinha que ser. Nada mais, nada
menos.
Portas e janelas podem estar
abertas, mas a solidão nos faz sentir tão pequeno diante da vida que barramos a
nossa essência. Portas e janelas podem estar fechadas, e sentirmo-nos
muitíssimos livres. Estar só leva a efetiva solidão mental e é sufocante
demais.
A hora, essa, eu sei que vai
chegar numa visita inesperada, rápida e indelicada, sem pedir licença ou sequer
esclarecer qualquer coisa para quem anda ao meu lado.
Serão dias e noites de desespero,
mas há de ser passageiro, afinal o tempo passa, o sentimento se fortifica e, a
saudade, embora permaneça, será sempre acompanhada de um conformismo autêntico
e típico de quem um dia se vai.
Uma saudade acompanhada de
vaidade, medo, desespero, esperança, vontade, amor. Quem foi, de carne e osso
se transforma em alma viva dentro do peito, transforma-se em sentimento,
sentido, momento, canção, palavra, poesia. Lágrima, sorriso , até mesmo oração.
Ela estará mais viva do que quando transitando em terra e, quando se der conta,
se cobrará do pouco tempo dedicado, da impaciência e do egoísmo exacerbado.
Mas tudo será tarde demais, porque nada
disso a trará de volta. A saudade e a dor aumentarão, mas lembre-se de que de
solitária tornou-se tudo o que perto de
você existe,para amar, proteger, ouvir e acolher quando preciso for.
Esta é a solidão de quem sente a
ida que ainda não foi.